Miniconto: Lições de um Umbaliano
Após todos esses anos de trabalho, resolvi dar a mim mesmo umas semanas de folga como presente. Nesse período de tempo, resolvi viajar. Destino: Umbala. Não sabia o que houve comigo, o que estaria pensando. Afinal, qual outro doido abandonaria todo o conforto e luxo de Lighthalzen para ir a um “fim-do-mundo” desses?
Os habitantes de Umbala eram muito amigáveis. Parecia que já estavam muito acostumados com turistas como eu. Embora nossas culturas e até mesmo a própria forma física do corpo sejam tão diferentes, estavam sempre dispostos a ajudar. Imediatamente, prepararam para mim uma pequena casinha feita de palha, numa das árvores um pouco ao leste de sua tribo, e convidaram-me a participar da dança à noite, ao redor de uma enorme fogueira. Poucos deles realmente falavam a minha língua, então faziam gestos que pareciam saltitantes Pickys, enquanto eu tentava decifrar o que queriam dizer. Trabalhoso, mas divertido.
Um rapaz em particular observava-me. Acho que tinha alguma dúvida, mas, embora seja um dos poucos que conseguia falar minha língua, ficava calado. Finalmente, à noite do terceiro dia, veio me procurar:
- Por que você come?
Achando interessante, resolvi respondê-lo com outra pergunta:
- E por que a pergunta?
- É que você sempre olha para aquela coisa esquisita na sua mão, para então resolver se vai comer ou não.
Ele apontava para meu relógio.
Então resolvi explicá-lo sua utilidade, a relação entre o relógio e o tempo. Ao meio-dia, o sol situa-se bem em cima de nós, e os ponteiros apontam para cima; hora do almoço. Às seis da tarde, o sol se põe, e o ponteiro também aponta para baixo; hora do jantar. Tentava fazê-lo compreender essa atitude um tanto estranha para eles. Chegou a hora, então precisava comer.
O rapaz, então, deu um enorme sorriso (embora nem conseguia ver seu rosto atrás da grande e exótica máscara), como se finalmente resolvesse seu mistério: “Há! Entendi! Você é um adorador do sol. Você come para honrar o sol.”
O conceito do tempo aparentava ser abstrato demais para umbalianos. Descobria que era difícil conversar com ele sobre isso. Resolvi perguntá-lo também:
- E você? Por que você come?
Mas sua resposta simples e direta me pegou de surpresa:
- Deu fome.
Após alguns dias observando-os, descobri que realmente eram assim.
Numa noite, antes de dormir, quis pegar um cacho de bananas, numa pequena colina perto de onde estava, para servir de café-da-manhã do dia seguinte. Mas o mesmo amiguinho não deixava.
- Já que ninguém está faminto, por que não deixar elas em paz, no lugar onde deveriam?
Vendo que não adiantava discutir com ele, não falei mais nada.
Horas depois, era acordado por um barulho estranho. Saí da toca, somente para encontrá-lo descendo da colina, com o cacho nas mãos.
- O que foi? - não sabia se deveria rir ou não.
- Deu fome agora.
Hum... lógico.
No dia seguinte, tinha que partir. Satisfeito, me deu o cacho de presente. Como muitas bananas estavam verdes ainda, resolvi levá-lo comigo, comê-los no caminho à casa, quando amadurecerem. Novamente, o rapaz discordava. Me aconselhava que era trabalhoso demais, visto minha mochila já muito grande e pesada. Resolvi jogar o cacho fora, mas ele balançava a cabeça para os lados mais bruscamente ainda.
- A terra-mãe nos deu essas bananas. Não podemos desperdiça-las assim.
Então, o que deveria fazer? Eis sua conclusão:
- Espera aqui até ficar amarelas.
Olhava-o incrédulo, sem saber como reagir, enquanto ele continuava:
- E por que não esperar? Esperamos a safra chegar, esperamos os frutos surgir nas árvores. Esperamos nossas esposas dar a luz, esperamos os filhos crescer. Esperamos envelhecer, esperamos morrer. Esperamos por uma vida inteira. Por que não esperar umas bananas amadurecerem? Pra que toda essa pressa?
É. Boa pergunta. Talvez já estivéssemos acostumados demais ao ritmo rapidíssimo da nossa civilizada sociedade. Ainda mais numa cidade como o Lighthalzen, onde cada mínimo segundo precisava ser aproveitado ao máximo. Vivemos tão apressados que até esquecemos de pensar de vez em quando, se realmente era assim que a vida deveria ser.
O umbaliano pediu para que esperasse as bananas amadurecerem. Talvez seja um pouco difícil demais para mim, pois realmente precisava voltar.
Não creio que seja necessário esperar tão lentamente e inocentemente como fazem. Mas frear os passos de vez em quando acho que não prejudica ninguém. Quem sabe, numa tarde de domingo, resolve passear um pouco e desfrutar dessa simples e confortável liberdade que é de meu direito.
Obrigado, Umbala.
Fim.
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"Texto inspirado num dos discursos do doutor Hou.
( http://www.crown.com.tw/book/wenyong/aut.htm
Infelizmente, não achei em outra língua...
E não. Aqui não tem a palestra que fui ouvir... )"
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